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Folclore Verbal

Linguagem Criptológica

JOSÉ SANT'ANNA

A palavra é o mais notável privilégio do homem e se transmite de geração a geração, alterando-se, mas conservando o seu sentido original.
Para que se crie uma linguagem, a vida social é absolutamente necessária.
O homem é dotado da faculdade de linguagem, isto é, da comunicação de seus pensamentos.

Falando, nós podemos fazer com que o nosso interlocutor nos entenda a mensagem. Nossa língua tem sons característicos, seus gestos e seus artifícios de linguagem. A linguagem é exercida, principalmente, pelos sons da voz humana.

A Linguagem Criptológica (Conversa Criptológica, Idioma Criptofônico ou Falar em Língua) é tradição popular e lembra costumes da coletividade infanto-juvenil de épocas remotas que persistem até hoje. É convencional e resulta de um prévio entendimento e conhecimento de seus adeptos.
Sua fonte natural é o povo que transmite suas experiências, isto é, sua fonte é o folclore.

Sua manifestação primitiva é a linguagem oral, então é evidente que não se possa fixar a sua origem, dizendo de onde veio ou quem a inventou. É transmitida de boca em boca pelas criaturas. É anônima, pois não é de ninguém. Pertence ao povo.

A civilização pouco a pouco vem instruindo, educando e disciplinando a inteligência do homem, cerceando-lhe a imaginação, a ingenuidade e simplicidade, porém, não lhe destrói a feição folclórica, o que nos permite encontrar a linguagem criptológica como extraordinário legado de ontem à geração de hoje.

Enquanto o povo, desejando sempre uma clareza maior, simplifica, instintivamente, a língua que fala, sem se preocupar com a simples correção; de outro lado, integrantes deste mesmo povo, procuram complicá-la, com o sentido de confundir ou tornar sigilosa a emissão do pensamento.

O êxito da linguagem criptológica consiste no surpreendente segredo de transformar as variantes dos fonemas, isto é, os sons reais da palavra escapam a nossa observação; não podem ser, portanto, compreendidos pelo ouvinte destreinado. O ato complica a comunicação. O único recurso empregado é a repetição, pois é incontestável esse valor.

Com método, com atenção, com interesse inspirado sempre no pensamento reflexivo, este passatempo revela a criança e a criança revela-se neste passatempo.

Os pré-adolescentes, os adolescentes e mesmo alguns adultos participam do Falar em Língua, porque adentra-lhes à alma, captando-lhes as reações.
É um tipo de argô (lingua completamente adulterada, pois as "palavras" têm sentido só compreensível pelos que as usam ou têm interesse em conhecê-las). Só os iniciados são capazes de praticá-la, pois criam-se novos sons no sistema.

Não deixa de ser um ato de comunicação, pois há alguém que transmite a mensagem: o emissor, a alguém que recebe essa mensagem e a compreende: o receptor; os quais obedecem a regras certas, pré-estabelecidas, para essa linguagem fechada.

O papel do curioso é observar os fatos de linguagem para descobri-los, somente ouvindo quem fala, pois para consolidar os conhecimentos adquiridos, sem treino, só há o meio de ouvir freqüentemente os que falam, isto é, dependendo da inteligência, do raciocínio e da observação.

Existe um rico material de observação no que diz respeito à linguagem criptológica, com embaraços (sons intermediários articulados antes, depois ou no meio das sílabas das palavras que geram esse exótico linguajar).
Vejamos o assunto sob à luz de exemplos colhidos com o intuito de esclarecer o mecanismo das mudanças fonéticas.

A) Vocábulos - obstáculos, monossilábicos, colocados antes das sílabas da palavra.
Linguagem do Gê

1)(gê) O (gê) ho (gê) mem (gê) é (gê) ve (gê) lho.
O homem é velho. Linguagem do Pê
2)(pê) Deus (pê) é (pê) a (pê) ver (pê) da (pê) de.
Deus é a verdade. Linguagem do Cê
3)(cê) Vo (cê) cê (cê) gos (cê) tou (cê) da (cê) mú (cê) si (cê) ca?
Você gostou da música? Linguagem do Guê
4)(guê) O (guê) Bra (guê) sil (guê) é (guê) gran (guê) de.
O Brasil é grande. Linguagem do Pô
5)(pô) O (pô) Se (pô) nhor (pô) é (pô) meu (pô) pas (pô) tor.
O Senhor é meu pastor. Linguagem do Rê
6)(rê) Vo (rê) cê (rê) an (rê) da (rê) a (rê) pé?
Você anda a pé? Linguagem do Bê
7)(bê) Os (bê) pá (bê) ssa (bê) ros (bê) vo (bê) am.
Os pássaros voam. Linguagem do Tô
8)(tô) A (tô) u (tô) ni (tô) ão (tô) faz (tô) a (tô) for (tô) ça.
A união faz a força. Linguagem do Xis
9)(xis) As (xis) cri (xis) an (xis) ças (xis) são (xis) de (xis) Deus.
As crianças são de Deus.

B) Vocábulos - obstáculos, monossilábicos, colocados depois das sílabas da palavra.

Linguagem do "Guê"
10)Vo (gô) cê (guê) é (gué) bra (gá) si (gui) lei (guei) ro (gô)?
Você é brasileiro?
Linguagem do "Pê" seguido por sons vocálicos da sílaba precedente
11)Vo (pô) cê (pê) es (pês) tá (pá) a (pá) le (pé) gre (pê).
Você está alegre. Linguagem do Quê
12)Gos (quê) to (quê) do (quê) teu (quê) so (quê) rri (quê) so (quê).
Gosto do teu sorriso. Linguagem do Pê
13)Deus (pê) é (pê) o (pê) ca (pê) mi (pê) nho (pê).
Deus é o caminho. Linguagem do Guei
14)A (guei) la (guei) ran (guei) ja (guei) é (guei) do (guei) ce (guei).
A laranja é doce.

C) Vocábulos - obstáculos, dissilábicos, colocados antes das sílabas da palavra.
Linguagem do Faim

15)(faim) As (faim) fio (faim) res (faim) são (faim) be (faim) las.
As flores são belas. Linguagem do Menê
16)(menê) As (menê) ro (menê) sas (menê) são (menê) per (menê) fu (menê) ma (menê) das.
As rosas são perfumadas. Linguagem do Regue
17)(regue) Os (regue) li (regue) vros (regue) são (regue) no (regue) ssos (regue) a (regue) mi (regue) gos.
Os livros são nossos amigos. Linguagem do Teco
18)(teco) Ma (teco) ca (teco) co (teco) ve (teco) lho (teco) não (teco) me (teco) te (teco) a (teco) mão (teco) em (teco) cum (teco) bu (teco) ca.
Macaco velho não mete a mão em cumbuca. Linguagem do Geri
19)(geri) De (geri) ve (geri) mos (geri) es (geri) tu (geri) dar.
Devemos estudar. Linguagem do Níver
20)(níver) Eu (níver) es (níver) tou (níver) ner (níver) vo (níver) so.
Eu estou nervoso. Linguagem do Fonfom
21)(fonfom) Je (fonfom) sus (fonfom) é (fonfom) re (fonfom) a (fonfom) lis (fonfom) ta.
Jesus é realista.

D) Vocábulos - obstáculos, dissilábicos, colocados depois das sílabas da palavra.

Linguagem do Parra, Perré, Pirri, Porró, Purru
22)E (perrê) les (perrês) não (parrão) gos (porrós) tam (pairam) de (perrê) mú (purru) si (pirri) ca (parra).
Eles não gostam de música. Linguagem do Candê
23)Co (candê) mo (candê) é (candê) gran (candê) de (candê) o (candê) mun (candê) do (candê).
Como é grande o mundo.
Linguagem do Radical "Pep", segui¬do dos sons vocálicos da sílaba antece¬dente
24)Que (pepê) rer (peper) é (peper) po (pepô) der (peper).
Querer é poder.
Linguagem do Farra, Ferre, Ferri, Forró, Furru, cujo radical será seguido dos sons vocálicos da sílaba precedente
25)Voz (forrós) do (forró) po (forró) vo (forró) é (ferre) a (farra) voz (forrós) de (ferre) Deus (ferreus).
Voz do povo é a voz de Deus. Linguagem do Tibum
26)Eu (tibum) te (tibum) a (tibum) mo (tibum) meu (tibum) Bra (tibum) sil (tibum).
Eu te amo meu Brasil.

Linguagem do Cuntim
27)Eu (cuntim) sou (cuntim) bra (cuntim) si (cuntim) lei (cuntim) ro(cuntim).
Eu sou brasileiro. Linguagem do Taraz
28)Que (taraz) ro (taraz) si (taraz) lên (taraz) cio (taraz).
Quero silêncio. Linguagem do Faim
29)As (faim) ro (faim) sas (faim) têm (faim) es (faim) pi (faim) nhos (faim).
As rosas têm espinhos. Linguagem do Garra
30)O (garra) do (garra) min (garra) go (garra) é (garra) di (garra) a (garra) san (garra) to (garra).
O domingo é dia santo.

E) Vocábulos - obstáculos, trissilá-bicos, colocados antes das sílabas da palavra.

Linguagem do Chiprocó
31)(chiprocó) A (chiprocó) mu (chiprocó) lher (chiprocó) que (chiprocó) brou (chiprocó) o (chiprocó) po (chiprocó) te.
A mulher quebrou o pote.

F) Vocábulos - obstáculos, trissi-lábicos, colocados depois das sílabas da palavra.
Linguagem do Pirilim
32)Ho (pirilim) je (pirilim) vou (pirilim) es (pirilim) tu (pirilim) dar (pirilim) mú (pirilim) si (pirilim) ca (pirilim).
Hoje vou estudar música. Linguagem do Tililim
33)O (tililim) ho (tililim) mem (tililim) é (tililim) in (tililim) te (tililim) li (tililim) gen (tililim) te (tililim).
O homem é inteligente.
Linguagem do Garará, Guereré, Guiriri, Gororó, Gururu, cujo radical será seguido dos sons vocálicos da síla¬ba anterior.
34)Vo (gororó) cê (guererê) vai (gararai) em (guererei) bo (gororó) ra (garará)?
Você vai embora? Linguagem do Chaparrá
35)O (chaparrá) me (chaparrá) ni (chaparrá) no (chaparrá) es (chaparrá) tá (chaparrá) cho (chaparrá) ran (chaparrá) do (chaparrá).
O menino está chorando. Linguagem do Xereré
36)Bem (xereré) a (xereré) ven (xereré) tu (xereré) ra (xereré) dos (xereré) os (xereré) que (xereré) cho (xereré) ram (xereré).
Bem - aventurados os que choram. Linguagem do Gueriguei
37)O (gueriguei) sol (gueriguei) es (gueriguei) ta (gueriguei) va (gueriguei) quen (gueriguei) te (gueriguei).
O sol estava quente. Linguagem do Filelê
38)O (filelê) sol (filelê) es (filelê) tá (filelê) mui (filelê) to (filelê) quen (filelê) te (filelê).
O sol está muito quente. Linguagem do Paepé, Peepé, Piepé, Poepé, Puepé
39)Vo (poepé) cê (peepé) vai (paepé) ca (paepé) sar (paepé)?
Você vai casar?
Linguagem do Concrespo/Concraspo
Intercalam-se após cada sílaba da pala¬vra, alternadamente, os vocábulos concrespo/concraspo.
40)Eu (concrespo) plan (concraspo) tei (concrespo) um (concraspo) pé (concrespo) de (concraspo) jas (concrespo) mim (concraspo).
Eu plantei um pé de jasmim.

G) Vocábulos - obstáculos, monossilábicos, colocados antes e depois da sílabas da palavra.
Linguagem do Za...Ci
41)(zá) Não (ci) (zá) gos (ci) (zá) to (ci) (zá) de (ci) (zá) do (ci) (zá) ce (ci).
Não gosto de doce.

H) Também para confundir o ouvinte, é costume intercalar entre as sílabas das palavras, uma outra palavra já existente na língua.
Por exemplo: garrafa, caneca, etc. Linguagem do Garrafa
42)O (garrafa) ho (garrafa) mem (garrafa) é (garrafa) mor (garrafa) tal (garrafa).
O homem é mortal. Linguagem do Caneca
43)Mi (caneca) nha (caneca) ca (caneca) sa (caneca) é (caneca) gran (caneca) de (caneca).
Minha casa é grande. Linguagem do I

I) Todas as vogais (a, e, o, u) orais e
nasais são substituídas pela vogal I.
44)I criínci isti ni quírti índi dírmi.
A criança está no quarto onde durmo.

J) Pela substituição das vogais por outros elementos fonéticos: a - ais; e - enter; I - ínis; o - ômber; u - úfiter.
45)Ômber múfiter-rômber dais caszais dômber viniszinisnhômber enter maisrrômber.
O muro da casa do vizinho é marrom.

L) Substituindo-se as vogais orais e nasais que formam sílaba com a consoante "p" pela vogal "e" que aparece nas sílabas da palavra que se quer formar.
46)E (po) me (pum) de (po) ge (pi) re (pa).
O mundo gira.

M) Pela troca de consoantes entre vogais de uma palavra. Neste caso, as palavras monossilábicas não se alteram. A permuta de consoante entre palavras dissilábicas é fácil. A maior dificuldade reside nas polissilábicas, cuja permuta deve operar-se em ordem decrescente.
47)Dope vocher gofo.
Pode chover fogo.

N) Pela Inversão da sílabas das palavras (do fim para o começo). Também, neste caso, as palavras de uma sílaba não sofrem alteração.
48) Toues domanto nhoba.
Estou tomando banho.
49) Meu mãoir vai tarma o copor.
Meu irmão vai matar o porco.

O) Pela prolação dos fonemas que en-tram na constituição das sílabas da palavra.
Permanecem inalterados os artigos e pronomes o, a; preposição a; conjunção e; a forma verbal é (verbo ser); as interjei-ções ah!, eh!, ih!, oh! (ou ó) e uh! e as
vogais que, sozinhas, formam sílabas.
50) A, beór - bôr, beó - bô, leé - lê, teá - tá, é, a, zeul - zul, e, veer - ver, meê - mê, lheá - lha.
A borboleta é azul e vermelha.
A linguagem criptológica é uma arte e uma técnica. Arte, porque estabelece os preceitos de uma ação prática. Técnica, porque racionaliza os preceitos desta arte.
Apresenta várias funções, das quais apontamos:
a) Preparadora - coordena noções principais, focalizando particularidades que são necessárias para a comunicação. Prepara o falante para receber a instrução.
b)Motivadora - desperta entre os falantes o interesse pelo assunto. Apresenta a experiência.
c)Disciplinadora - alerta os falantes, chama-lhes a atenção para o assunto.
d)Reflexiva - leva a raciocinar e refletir sobre o assunto. Esclarece dúvidas.
e)Diagnosticadora - apura se os falantes estão ou não preparados para a conversação.
f)Recapituladora - encoraja as atividades dos falantes. Orienta a formação de hábitos. Toca nos pontos fundamentais já tratados.
g)Aplicadora - usa a teoria nos exercícios práticos.
A aprendizagem deste divertimento popular depende, sobretudo, da associa¬ção de novos estímulos sensitivos, com padrões de memória que existem anteriormente. Apresenta algumas vantagens: Prende a atenção e desperta o interesse dos que a falam. Aproxima as amizades. Torna o assunto movimentado e alegre. Distrai. Educa a atenção. Torna a comunicação secreta. Exerce o autocontrole. Desenvolve um sistema de treinar a memória. É analítica e exige memória auditiva, vocal ou fônica, desenvolvendo a facilidade, tenacidade e exatidão. Vence dificuldades. Consolida os conhecimentos adquiridos. Forma o hábito de falar e ouvir.
Salvo os casos de gravidade, próprios de especialistas e psiquiatras, os exercícios freqüentes da conversa criptológica servem de terapêutica na correção de algumas anomalias da linguagem - comunicação, como algumas perturbações não muito graves:
a)dislalia: articulação imperfeita por deficiência de estrutura nos nervos glóssicos.
b)mogilalia: dificuldade de articulação de muitos sons, por falta do domínio dos órgãos periféricos da palavra: gamacismo (dificuldade de pronunciar fonemas constritivos: c, g e x = cs); sigmatismo (dificuldade de pronunciação do r) e lambdacismo (dificuldade de pronunciação do I).
c)bradilalia: articulação lenta e defeituosa da palavra.
d)bradiartria: articulação lenta e defeituosa da sílaba.

Retornemos ao Assunto

O sigilo produz-se quando o som interposto às sílabas toma confusa a compreensão do vocábulo. Esta compreensão só é possível apenas por um esforço de atenção. A causa das transformações do som da palavra reside nas modificações impostas (determinadas) pela intercalação do vocábulo - obstáculo.

Quando pronunciamos uma palavra, com os sons partitivos da sílaba, produz-se a abertura de um caminho para a classe de fatores que vêm perturbar a regularidade da prolação dessa palavra.

Estas alterações constituem variantes extrafonológicas de uma cadeia sonora vocabular e somente, com dificuldade, se atinge o sistema fonológico da língua, pois se perde o reflexo e a generalização, na consciência social, da palavra emitida. A alteração vai interessar somente às pessoas que fizeram os treinos, que descobriram o segredo. Pode-se comparar ao idioleto -linguagem especial, fechada, de um grupo, ou melhor, de até somente duas pessoas.

Assim sendo, a língua passará a um estágio monossilábico. A palavra se produzirá completamente pela eliminação dos vocábulos - dificuldade, na maioria dos casos artificiais, com raríssimas exceções não constituídos de vocábulos onomatopaicos, tomando-se o som da voz pelo signo dos sons da natureza, com variedades caprichosas de uma língua inteiramente "estranha".

Pode-se, pois, afirmar que sob a influência da intromessão de vocábulos - chave, só através de maiores esforços para organizar esse tipo de língua, pode a pes¬soa aprender os seus segredos. O som que se intercala, apresenta dificuldade de pronúncia para o emissor (o codificador) e também para o recebedor (o decodificador).
Com isto há uma série de fatores que perturbam a marcha normal da comunicação. Mas há palavras que não sofrem alterações. Passam a exceções. Nelas estão as partículas, palavras monossilábicas da língua.

Se o que é emitido pelo sujeito falante for compreendido por um interlocutor, constatamos um ato de comunicação pela língua (secreta), pois equivale a uma ação e é um ato de linguagem individual; o circuito lingüístico estabelecido entre o sujeito falante e o interlocutor, não deixa de representar, para eles, uma instituição social: uma língua.
Pelo estabelecimento de uma norma adotada pelos sujeitos falantes do grupo ensaiado, passa da linguagem individual à língua, e serve para um grupo de pessoas se comunicar.
É preciso que o receptor compreenda o código usado pelo emissor, pois haverá efetivamente comunicação se os dois co¬nhecerem o mesmo código, isto é, é preciso que eles usem a mesma linguagem secreta, para a transmissão de mensagens e de comunicação.

Se ouvirmos alguém conversar numa língua que não entendemos, somos capazes de perceber os significantes, isto é, os sons que a pessoa emite, porém, não conseguimos associá-los a nenhum significado. Podemos combinar de modo pessoal o material lingüístico e, dessa forma, criar a fala. Por outro lado, se houver alguém ouvindo aquela transmissão criptológica, mas que não conheça o código, poderá perceber alguma coisa, mas não poderá decifrar a mensagem, pois não é capaz de relacionar os sons a nenhum significado.
Como "coisas" de crianças e jovens, é um divertimento que se caracteriza pela vivacidade e parece misterioso. Utilizada como língua secreta e com extraordinária rapidez, maior é o desafio à perplexidade dos circunstantes.

Depois de haver aprendido, racionalmente, toda a parte básica dos truques, o participante assenhorar-se-á dos pormenores e das particularidades, formando um bom alicerce, e isto servirá para a combinação de brinquedos, recreação e distrações: jogar bola, nadar, caçar, pescar ou, ainda, para marcar encontro de namorados.
Apresenta algumas desvantagens: é cansativa, enervante. Irrita os adultos, principalmente os mais idosos, que se aborrecem por desconhecerem os segredos dessa comunicação verbal. Hoje os tempos estão mudando. Poucas são as pessoas que ainda cultivam o passatempo da comunicação criptológica, porque precisam instruir-se, realizando ensaios. E a criançada só quer moleza.

NOTA: Todos os exemplos de Linguagem Criptológica registrados neste traba¬lho foram recolhidos no Município de Olímpia - SP, principalmente nos meios infantis, juvenis e mesmo adultos, dos diferentes bairros e no distrito de Ribeiro dos Santos, nos anos de 1977 e 1978. Publicado no Anuário do Folclore de Olímpia, n.° 9, em 1979.